O mito da otimização do tempo: o preço de fazer tudo ao mesmo tempo
Eu não lembro quando foi a última vez em que realizei uma única tarefa por vez. Sempre me percebo lavando louça enquanto assisto a uma aula, dirigindo e adiantando o episódio do podcast que será tema da sessão seguinte, ou, quando sobra um tempinho entre uma tarefa e outra, aproveito para pôr em dia a leitura que vai aperfeiçoar aquele meu déficit em determinada soft skill. Até o banho — que era meu momento — virou o instante de organizar mentalmente a pauta da reunião seguinte.
A verdade é que essa tentativa de otimizar o tempo só aumenta meu cansaço e, no fim, não lembro da metade do conteúdo de todas essas coisas que foram sendo “executadas”.
Gerir o tempo é gerir a vida. E fomos, contradizendo Ailton Krenak*, tornando a vida útil — tão útil — que paramos de fazer coisas que deveriam existir apenas pelo prazer de fazê-las. E pior: vivemos tentando “ganhar tempo”, presos em um ciclo interminável de adiantar tarefas. Será que, ao ganhar tempo, não estamos apenas fugindo do presente?
Já se perguntou quanto tempo demoraria para concluir uma atividade se deixasse de usar o celular enquanto faz?
Enquanto acreditamos estar otimizando o tempo, estamos cada vez mais sujeitos às distrações: notificações infinitas, o movimento automático de pegar o celular, o scroll nas redes sociais. Não percebemos que, a cada interrupção, o cérebro precisa “recomeçar” o processo de concentração — o que consome energia e reduz a qualidade do que produzimos.
Estudos da Universidade da Califórnia mostram que, em média, conseguimos manter a atenção em uma tela por apenas 47 segundos antes de sermos interrompidos. E que, ao trocar de tarefa, levamos cerca de 25 minutos para retomar o nível original de foco. Ou seja, o tempo que acreditamos estar “ganhando” ao responder mensagens rápidas ou checar o celular é, na verdade, tempo perdido.
Gerenciar o tempo, portanto, não se resume a usar uma agenda ou fazer listas de tarefas: é, antes de tudo, aprender a cuidar da própria atenção. Ou, quem sabe, reaprender a fazer uma tarefa por vez.
Pesquisas da UFMG e da San Diego State University reforçam que o uso excessivo de telas está relacionado à piora da saúde mental e à queda na produtividade. Mas não se engane — não se trata de eliminar a tecnologia (até porque é difícil imaginar a vida atual sem ela), e sim de pensar no seu uso de forma consciente.
O próprio celular oferece recursos para monitorar o tempo de uso e definir metas digitais. Quando conseguimos ajustar para um uso racional, melhoramos nossa satisfação e eficiência, já que reduzimos o ruído mental e direcionamos energia ao que realmente importa. Além disso, podemos criar ambientes que favoreçam a concentração e reservar momentos sem notificações.
Por aqui, depois de perceber que passava tempo demais em frente às telas, tenho testado pequenas regras para melhorar minha relação com o tempo:
Horário específico para começar e encerrar o expediente;
Pausas reais para as refeições, sem responder mensagens ou resolver demandas;
Blocos de trabalho contínuo, com intervalos para respiro e alongamento;
Momentos de lazer que não envolvam telas;
Mapeamento semanal do tempo, identificando pausas, distrações e imprevistos — permanecendo mais atenta aos meus objetivos reais e separando o que é importante do que é urgente.
Produtividade sustentável é aquela que permite resultados consistentes sem esgotar o corpo nem a mente. E isso inclui reconhecer o valor do ócio: é nos intervalos, nas pausas e no silêncio que o pensamento se reorganiza e nasce a criatividade.
O tempo é o nosso ativo mais precioso. Talvez a produtividade não seja fazer mais em menos tempo, mas fazer com presença o que realmente importa.
Na Síncrona, promovemos saúde mental e produtividade sustentável em empresas e equipes, apoiando quem deseja transformar o modo de se relacionar com o tempo e com o próprio ritmo, nos mande uma mensagem e conheça nossos programas de acompanhamento.
*Ailton Krenak: líder indígena, filósofo e ambientalista, autor do livro “A vida não é útil”.
https://valor.globo.com/patrocinado/dino/noticia/2024/06/04/estudo-revela-perigos-do-uso-excessivo-de-telas.ghtml

